A culpa
O silêncio é a culpa
A convicção secreta e quase eterna de que a uma deusa não se contempla a possibilidade do erro. Todas as suas atitudes estarão acima do bem e do mal. Aliás, o mal somente estará encarnado num desacerto de perspectiva, do tempo congelado na memória inibida. A aproximação será concedida apenas ao cativo arbítrio da deusa. Pela deusa onisciente e a juíza sem equívocos do pensamento alheio. Estar apartado não é uma convicção, antes seria sempre a punição humilhante e inevitável. Contudo, e se não for assim o real? Se um dia, em mais de um dia, a deusa mentira? Se, naqueles noutros dias, olhou por espelhos alheios e as palavras refletidas estavam cirílicas? Se no palco do firmamento, as sombras estiveram retidas num caixa de chumbo repleta do material das nuvens? E se o silêncio, mal interpretado, fosse apenas a culpa? A culpa pelo erro do dia, a culpa no equívoco do julgamento, a culpa pelo sofrimento lapidado em mármore, a culpa pela morte?