Duas personagens

 

dois homens em elba

 

Pedro Gonzaga

 

dois homens se encontram em elba

fora dos séculos que os separam

dois homens não sabem que em elba

reserva-lhes a força vulgar do destino

uma queda e uma esperança

que hão de acometê-los

cada qual a seu momento

como sói ocorrer nos falsos paralelismos

da história e da poesia.

 

em elba está ovídio

na companhia do amigo fiel

insciente de que já o convoca

o imperador com a ordem do desterro

que lhe espera uma terra esquecida

para além do bósforo

que a crença no perdão

e a volta à roma eterna

perduradas apenas nos versos tristes

finamente encadernados na edição

da loeb classicals

 

em elba está napoleão

imerso ainda nas sombras frias

da desastrosa campanha na rússia

abandonado por seus marechais

a tramar o triunfal retorno

entre ameaças de veneno e morte

a uma paris por ele mesmo modificada

a um mundo que agora mais bem o terá

como uma estátua de madame tussot

tendo por cenário santa helena

 

dois homens reproduzem em elba

o desperdício infinito dos gênios

dois homens encarnam em elba

o estratagema dos maus atores

que não escapam à armadilha

de serem personagens de si mesmos

 

 

 

© Pedro Gonzaga

publicado por ardotempo às 13:07 | Comentar | Adicionar