Canonizações

Sobre martírios e milagres

 

Mariana Ianelli


Consta que, até o Natal, o papa Bento XVI anunciará a beatificação de Irmã Dulce, o Anjo Bom da Bahia. Com isso, fica reconhecido pela Igreja Católica o primeiro milagre atribuído a Irmã Dulce. O próximo passo será a abertura de um novo processo, agora, para canonizá-la. O caminho da beatificação à santidade dependerá da comprovação de mais um milagre. O processo deve tramitar no Vaticano por algum tempo até ser aprovado. Enquanto isso, Irmã Dulce já pode ser declarada oficialmente venerável e beata, uma religiosa de virtudes heroicas.

Por coincidência, nesses últimos meses, li três peças de teatro sobre religiosas heroicas. A primeira delas, Diálogos das carmelitas, de Georges Bernanos. A história se passa em plena Revolução Francesa, mostra a invasão de um convento por uma multidão em marcha ao som da Carmagnole, e termina em uma praça abarrotada e emudecida, que assiste às carmelitas entoando o Veni Creator enquanto se dirigem, uma a uma, para o cadafalso.

 

O segundo texto, do argentino Gabriel Cacho, já resume no título o ápice da tragédia: Edith Stein na Câmara de Gás. Basta dizer que, na cena final, depois de fotografada, Edith Stein está se despindo para o banho enquanto ao fundo uma orquestra toca A Viúva Alegre.

 

A terceira peça, de Hilda Hilst, chama-se A Empresa. O cenário, geometricamente definido por um triângulo equilátero dentro de um círculo, é a alegoria de um teorema. São poucos mas essenciais os elementos que caracterizam o ambiente de um internato religioso e de um laboratório. O martírio da religiosa, nesse texto, começa com a morte de uma ideia e termina em uma aniquilação macabra, asséptica.


Voltando, então, ao Anjo Bom da Bahia e aos trâmites burocráticos, apenas para um adendo à notícia. Três anos atrás foi beatificada pela Igreja a Irmã Lindalva Justo de Oliveira, que morreu em Salvador um ano depois de Irmã Dulce. Ambas dedicaram a vida à caridade e prestaram assistência aos doentes e aos idosos. Ambos os processos de beatificação começaram a tramitar no Vaticano em 2000. Irmã Lindalva, no entanto, não precisou de um milagre para ser proclamada beata. Morreu no abrigo Dom Pedro II, onde trabalhava, assassinada com 44 facadas.

 

Mariana Ianelli - Publicado em Vida Breve

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publicado por ardotempo às 11:30 | Comentar | Adicionar