Jogo da bola

A intimidade virou arte

 

Luísa Roig Martins

 

 

 

 

Com as lentes de uma câmera fotográfica, Gilberto Perin pôs seus olhos onde os de mais ninguém já haviam chegado. Registrou, em imagens, um Brasil de Pelotas fora do campo de futebol e da visão comum da torcida. Pois é lá, nos bastidores dos estádios, que os jogadores expressam suas angústias, discutem táticas, comemoram bons resultados e, em um dos momentos mais íntimos e pessoais, rezam.

 

Como um ser invisível, o fotógrafo acompanhou o elenco xavante por quase quatro meses, no ano passado, durante a disputa da Segunda Divisão Gaúcha. O resultado: a exposição e o livro intitulados Brasil – Camisa brasileira, este último com inserções textuais de Aldyr Schlee e João Gilberto Noll. À venda nas livrarias Vanguarda e Mundial (em Pelotas RS), a obra tem o selo da edições ardotempo, a mesma do livro Don Frutos, de Schlee.

 

Em Pelotas, o lançamento será simultâneo à inauguração da mostra, no dia 18 de agosto, no Museu de Arte Leopoldo Gotuzzo (MALG). A curadoria é do escritor e artista plástico Alfredo Aquino. Antes disso, porém, o trabalho será apresentado no Museu de Futebol, em São Paulo, e em Bagé, ainda sem local definido, a partir do dia 13 de julho.

 

 

O projeto foi concebido por Perin como uma forma de resgatar o antigo hábito de documentar o que ocorria nos vestiários – locais aos quais, hoje em dia, nem mesmo a imprensa especializada tem acesso. “Antigamente, no intervalo e ao final das partidas, os repórteres de rádio transmitiam o som dos vestiários. Era direta a emoção expressiva dos jogadores, falando após as vitórias ou derrotas. E poeticamente, esse era um mundo que me interessava: os bastidores, essas coisas que não estão na parte da frente”, comenta o fotógrafo. Perin deu o primeiro passo: garantir a autorização do então presidente do clube rubro-negro, Helder Lopes. “Em função de sua proximidade com Schlee, que fez esse intermédio, ele topou. Eu queria fotografar um time batalhador. E ainda dei a sorte de trabalhar com um clube chamado Brasil, o que deu um significado muito maior ao projeto”, diz. Mas como deixar os atletas à vontade frente a presença de alguém que, mais do que “alheio” à equipe, apontava a ela suas lentes? Antes de qualquer atitude, uma conversa com os jogadores foi fundamental para explicar que ele não era nenhum tipo de espião. “Pois há outros tipos de intimidade além da física. É lá que eles definem estratégias de jogo, por exemplo”, aponta. Depois, fez o alerta: sempre que alguém não se sentisse à vontade com sua presença, era só levantar a mão e ele pararia de clicar. “Mas nenhum deles fez isso, em momento algum”, conta.

 

Durante todos os meses em que acompanhou os vestiários, Perin quase não conversou com os atletas. “Eu não queria interferir na cena. A intimidade foi criada pela não-intimidade”, define. As fotos de nudez, publicadas semana passada em galerias na web, chamaram a atenção dos internautas, mas representam menos de 5% do total de cliques. No total, são 50 fotos na exposição em 110 no livro, distribuídas em 114 páginas. “E a diversidade entre os próprios jogadores engrandeceu o ensaio. Naquele elenco, havia representantes de dez estados brasileiros”.

 


 

Se o vestiário é um mundo com o qual os torcedores fantasiam, Perin buscou expôr a bela natureza de um ser que vibra, sofre e se emociona. Humanizou o futebol de sentimentos que ninguém vê. “Este não é um livro sobre o centenário do clube. É um livro sobre bastidores. E me sinto privilegiado em ter as escritas de Schlee e de Noll. São duas feras. Eles deram consistência à obra”, afirma.

 

Livro Brasil – Camisa Brasileira

edições ardotempo

 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Saiba mais

 

Gilberto Perin (fotógrafo, diretor de cena, roteirista e jornalista) – www.gilbertoperin.com

 

 

 

Luísa Roig Martins - Publicado no Diário Popular - Pelotas

 

 

 

 

 

publicado por ardotempo às 19:01 | Comentar | Adicionar