Quinta-feira, 07.04.11

Dois poemas de Mariano Shifman

Aguas corrientes

 

Sin ellas, no sabríamos de Tales,

de la balsa del dios Marduk,

de Noé, los pecados y el diluvio


de los hombres que ellas fustigaron

por ser males de tierra y agua, barro.

 

Semilla y transporte de todo lo que vive,

origen del velado origen:

sin ellas hay sequía, sed y muerte;

sin ellas nunca jamás

no habría muerte, sequía ni sed.

 

Nada se da sin algo a cambio.

 

La espuma de vivir fluye incesante

aguas arriba, aguas abajo,

amigo Heráclito:

con ritmos y colores según suerte

 

por márgenes urdidas de antemano.

 

© Mariano Shifman

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

_____________________________


Peter Pan
 

Decir No

es huir felizmente

de los puntos de arribo,

atreverse a ignorar tierra firme.

 

Agua y aire quiero, y maravillas

que me aparten de cualquier destino.

 

Nunca regresaré del buen jamás:

pulvericé las piedras del obligado.

Y si la realidad insiste

convoco a las sirenas y al olvido.

 

No más palabras, sólo recreo;

quiero colores, tesoros a mano

y tiempo de hadas para mí

 

doce años toda la vida.

 

 

© Mariano Shifman

 

 


 

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publicado por ardotempo às 22:28 | Comentar | Adicionar

As pedras do rio

Sem medo de Virginia Woolf

 

João Ventura

 

Há 70 anos, numa dia como o de hoje, uma mulher ainda jovem, magra, branca, feminil, caminha solitária na margem do rio perto da sua casa na aldeia de Rodmell, em Sussex, onde se tinha refugiado com o seu marido Leonard fugindo aos bombardeamentos alemães sobre Londres. E enquanto vai pisando a areia grossa da margem, vai colhendo com as suas longas mãos de louca tranquila, como se flores fossem, as pedras com que vai enchendo os bolsos do casaco. Desliza, depois, rio adentro, deixando-se abraçar pelas águas profundas do rio, para, finalmente, escapar ao medo.

 

 

 

 

Quem assim entrou no suicídio, com medo de viver, foi Virginia Woolf, a romancista inglesa que gostava de passear nas margens da vida sob um céu sombrio e triste, e que, fosse em Londres, na velha mansão de família no bairro de Bloomsbury, fosse na casa perdida na paisagem verde negrejante de Sussex, num e noutro lugar sempre rodeada de enfermeiras, de malas para partir e regressar, de festas e convidados, escreveu romances, contos, ensaios, cartas e diários, antecipando-se a James Joyce no modo de forjar o monólogo interior e a polifonia de vozes que murmuravam tanto nos textos que escrevia como na sua mente bipolar.

 

Por isso, não ter medo de ler Virginia Woolf, que numa época de moral vitoriana vestia calças de homem, era sufragista, fumava em público cigarros egípcios, dava conferências em círculos operários e, como se isto não bastasse para fazer dela alguém desajustado aos olhos da sociedade, ter, também, mantido uma relação lésbica com a sua amiga Vita Sackville West, poeta e mulher de um lord. O seu fim foi coerente com a sua existência inconformista e radical.

 

Depois de uma noite sem bombardeamentos nazis, o dia 28 de Março amanheceu luminoso, transparente, frio. Antes de sair em direcção ao rio, Virginia ainda roubou à morte as três derradeiras cartas dirigidas a Leonard e à sua irmã Vanessa. Depois, tranquilamente, deixou-se abraçar pelas águas para não mais voltar a ver a claridade do dia. Vinte dias depois, um grupo de crianças haveria de encontrar o seu corpo numa das margens do rio Ouse.

 

Talvez naquele 28 de março, temendo voltar a sofrer uma crise de loucura e não poder suportá-la, a alma de Virginia tenha, finalmente, decidido não mais afrontar o inafrontável. Essa realidade intangível que se nunca chegou a compreender nem mesmo através da sua obra.

 

João Ventura - Publicado no dia 28 de março no blog O leitor sem qualidades

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publicado por ardotempo às 21:08 | Comentar | Adicionar

Editor: ardotempo / AA

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