Terça-feira, 18.01.11

Isento de ênfases, blindado ao ufanismo

 

Uma terra só


Flávio Loureiro Chaves


No processo cultural do regionalismo, as obras de Simões Lopes Neto e Amaro Juvenal assinalaram a mais alta expressão literária do gaúcho e também o seu limite histórico, isto é, a desagregação do mito em que outros pretenderam fixar a sua saga heróica.


Por isso mesmo, sob uma perspectiva dialética, estes textos já anunciam o esgotamento do regionalismo.


A Literatura subsequente é varrida pelo sopro de novos ventos: o Ciclo do gaúcho-a-pé, de Cyro Martins, o Incidente em Antares, de Erico Verissimo, e os contos do lbiamoré, de Roberto Bittencourt Martins.


Trata-se de resultantes notáveis de um mesmo processo onde surge um dos traços mais interessantes de nossa literatura atual: a permanência da região e a ultrapassagem do regionalismo. É certo que, em determinados casos, o aproveitamento do manancial folclórico e da linguagem localista sustentaram a continuidade de uma manifestação gauchesca.


Tal não é o caso de Aldyr Garcia Schlee. Aqui o passado histórico retorna como uma força subterrânea para recolocar o espaço sul-rio-grandense e o gaúcho no núcleo da matéria abordada. No entanto, não é lícito relacioná-lo à vertente do regionalismo.


Estamos, antes, diante do que Antônio Cândido denominou super-regionalismo, assegurando a universalidade na observação da particularidade.


A ficção de Aldyr Garcia Schlee pertence aos novos caminhos que se abriram durante os anos setenta, após a renovação roseana.


Seus temas profundos, capazes de garantir a amplitude da comunicabilidade, são a concepção trágica da existência e o absurdo essencial que aciona os personagens.


Aldyr Garcia Schlee só observa o passado heróico para confrontá-lo com o presente desprovido de magia.


Nesse processo, a sua ficção simultaneamente mantém o cenário tradicional para inseri-lo numa temática já situada na fronteira da modernidade.


Entende-se, portanto, que estejamos diante e um fato literário cuja importância não pode ser desprezada – o vínculo entre a tradição de raiz gauchesca e uma problemática que pertence ao homem contemporâneo de qualquer latitude. Eis um texto que se legitima a si mesmo.

 

 

 

 

Estou certo de que o desenvolvimento ulterior da obra de Aldyr Garcia Schlee nos permitirá parafrasear em relação a ele o que Tristão de Athayde em certa ocasião afirmou de Erico Verissimo: “não haver escritor que mais honre sua região, sendo o menos regionalista e ufanista de seus filhos”.


Isento de ufanismo, Aldyr Garcia Schlee revela-se legatário de uma tradição e proponente de um estilo que a renova.

Flávio Loureiro Chaves

Imagem: O escritor, por Alexandre Schlee Gomes

publicado por ardotempo às 20:54 | Comentar | Adicionar

Uma rua sem nome

Muito antiga, bem no centro, defronte ao rio

 

Existe uma rua em Jaguarão RS, bem no centro histórico recentemente tombado pelo Patrimônio Histórico Nacional (IPHAN). Anônima em sua inclinação elegante e sequencial em cotas, é literariamente preenchida de feitos, dramas e sonhos. É uma das mais antigas da cidade, partindo do cais, paralela à Ponte Mauá, ao lado da antiga Rua do Fogo (atual XV de Novembro), lindeira ao Mercado Público Municipal e à Delegacia da Capitania dos Portos. É parte integrante da história da cidade heróica, no frontão do sol e da linha divisória com o Uruguai. Traçada no mesmo eixo da ponte, simboliza um corredor de acesso, em abertura de diálogo generoso ao revés de uma trincheira transversal de obstáculo. Apesar de curta em sua extensão, está nutrida de testemunhos de fatos notáveis e triviais, estes talvez mais caudalosos, consistentes e humanos do que aqueles e em seus muros e paredes ecoam os murmúrios da memória da vida e da literatura. Esta rua central, debruçada e voluptuosamente entregue às lendas e aos caprichos do Rio Jaguarão, nunca teve um nome. Terá um nome e uma titulação até o final do ano de 2011.

 

 

publicado por ardotempo às 18:25 | Comentar | Adicionar

Editor: ardotempo / AA

Pesquisar

 

Janeiro 2011

D
S
T
Q
Q
S
S
1
2
3
4
5
6
7
8
9

Posts recentes

Arquivos

tags

Links