Quinta-feira, 22.10.09

Ressurreição

Regresso da Polaroid
 
 
 
 
Como Lázaro de Betânia, a Polaroid morreu mas vai voltar à vida. E bem pode dizer-se que o seu santo milagreiro foi o The Impossible Project, o grupo liderado por Florian Kaps (fundador do polanoid.net) que, depois do encerramento da fábrica de cartuchos Polaroid em Enschede, na Holanda, nunca deixou morrer a esperança de ver outra vez no mercado a "velha" fotografia analógica instantânea. E conseguiu, o lobby a favor da ressurreição da Polaroid resultou: em Junho o Summit Global Group anunciou a compra dos direitos de exploração da marca até 2014 e, depois de meses de especulação, o consórcio anunciou há dois dias que vai voltar a colocar no mercado a "maioria" dos formatos de filmes e novas máquinas, projecto que inclui também modelos digitais. Os produtos devem ficar disponíveis em meados de 2010. O The Impossible Project ficará responsável pelo fabrico das películas. Porque afinal "impossível" é só uma palavra.
 
Imagem: David Hockney - "Piscina ao sol" - Composição de polaroids / Fotografia, 1982
 

Publicado no Blog Arte Photografica 

publicado por ardotempo às 21:23 | Comentar | Adicionar

AVE, FLOR - Livro e Recital

Convite para lançamento de livro:

 

 

 

 

 

Livro Ave, Flor
Poemas de Cleonice Bourscheid
Imagens de Anelise Scherer
Prefácio de Armindo Trevisan
Apresentação de Paulo Amaral
Reproduções fotográficas das imagens de Pierre Yves Refalo
 
Recital Ave, Flor
Voz: Deisi Coccaro, Clarice Bourscheid e Luciana Kiefer
Viola: Fernando Mattos
Participação especial do Quarteto de cordas UNISINOS
Às 20h30min 
 
Dia 23 de outubro - sexta-feira
 
Local: Studio Clio
Rua José do Patrocínio, 698
Cidade Baixa - Porto Alegre RS Brasil
Fone: (51)  32 54 72 00
Edições ARdoTEmpo
 

publicado por ardotempo às 18:36 | Comentar | Adicionar

Onde está o inimigo?

A guerra do Rio é uma metáfora cavilosa
 
Elio Gaspari
 
 
O Rio ganhou um novo problema, a blindagem dos helicópteros da polícia (e por que só os da polícia?). Os três jovens mortos na entrada do Morro dos Macacos são uma nota de pé de página. Três dias de desordens nas estações da SuperVia já são coisa do passado. De uma hora para outra, o carioca sente-se num cenário de "Tropa de elite".
 
Primeiro ele parou de caminhar pelas ruas do bairro depois do jantar. Um país com a taxa de fecundidade de 6,3 filhos por casal não podia ir para a frente. Depois, faz tempo, surgiram as grades nos jardins do recuo dos edifícios. Do Leblon ao Leme há algo como 10 mil metros de calçadas gradeadas, mas não poderia ser diferente: nessa época a população favelada do Rio dobrara, de 335 mil pessoas para 722 mil.
 
Isso acontecia numa cidade em que, até 1983, pareceu irrelevante o fato de os ônibus não passarem pelo Túnel Rebouças, inaugurado em 1966. Parecia natural que a choldra da Zona Norte não tivesse acesso fácil a Copacabana e Ipanema.
 
Na virada do século foi preciso blindar o carro. Pensando bem, era uma impropriedade estatística. A taxa de fecundidade das brasileiras caíra para 2,9 filhos por casal. Estavam nascendo menos pobres, portanto, não fazia sentido que a população favelada chegasse a 722 mil almas, quase 15% da população da cidade.
 
Aos perigos e transtornos impostos ao carioca somou-se a cenografia de uma guerra. A crise da segurança pública do Rio não é uma guerra. Pode ser pior, mas não é guerra. Os quatro anos da ocupação alemã em Paris foram menos cruentos que quaisquer quatro anos do Rio, desde 1980.
 
A ideia de uma guerra pressupõe um inimigo perfeitamente identificado e a disposição de se utilizar todas as forças disponíveis para submetê-lo. Guerra pressupõe tentar devolver o Vietnã do Norte à Idade da Pedra.
 
Não há guerra no Rio, o que há é uma metáfora de conveniência. Ela cria o cenário da emergência, mas não pode dar o passo seguinte, que seria o reconhecimento de que uma parte da cidade está em guerra com outra, como aconteceu na Argélia, ou na África do Sul da fase mais agressiva do apartheid.
 
Esse passo não é dado porque, apesar dos surtos demofóbicos, a sociedade brasileira nunca se associou a um projeto desse tipo. Colocando a coisa de outro modo: o pedaço da sociedade que seria capaz de apoiar uma política de violência segregacionista, levando-a a consequências extremas, ainda não tem coragem para vocalizar suas propostas e não haverá de tê-la nos próximos anos. Pensar que essa linha de pensamento não existe é colocar a ingenuidade a serviço das boas maneiras.
 
A metáfora da guerra não define o inimigo mas, cavilosamente, deixa-o subentendido. Ele está na favela ("fábrica de marginais", na definição do governador Sérgio Cabral). Essa guerra sem inimigo produz cenários, cenas de batalha, vítimas e juras de vingança, nada mais. Tudo fica parecido com "Tropa de elite".
 
Uma metáfora pode sustentar um filme, mas não resolve as questões da segurança de uma cidade.
 
Se o clima de guerra sair da agenda do Rio não há qualquer garantia de que as coisas melhorem, mas pelo menos será retirada a cortina de fantasia que mascara políticas públicas fracassadas.
 

Elio Gaspari - Publicado no Blog do Noblat 

publicado por ardotempo às 18:27 | Comentar | Adicionar

Em busca da página perfeita

Um livro
 
A verdade é que já não me lembro onde comprei este livro, nem porquê. Estava ali na estante, fininho, à espera, com a sua capa sombria (uma toupeira coberta de insectos, pendurada de um ramo por uma corda) e o seu título misterioso: Évocation de Matthias Stimmberg suivi de Six notes autour de l’écriture et de l’obsession (Bibliophane-Daniel Radford, 93 págs., 2003). Hoje peguei-lhe. E apercebi-me que fui traído pelo nome do autor, Alain-Paul Mallard, que julguei francês. Na verdade é mexicano, nasceu em 1970 e vive actualmente em Paris, onde trabalha como realizador de cinema. A sua bibliografia resume-se a este livro, cuja primeira parte já tinha sido publicada no México, em 1995, e a Recels, outro volume de prosas curtas, editado já este ano por L’Arbre Vengeur.
 
 
Uma rápida consulta ao Google desfaz uma dúvida: e se Mallard, como o Matthias Stimmberg evocado nestas ficções, fosse um escritor imaginário? Não é. A informação online revelou-se escassa, mas encontrei um vídeo, fotos, algumas recensões e uma nota biográfica que menciona a «lenda familiar» segundo a qual o seu nome proveio de um soldado, participante na expedição militar francesa ao México (1861-1867), que se terá perdido nas margens do rio Papaloapan, no sul do estado de Veracruz.
 
Comecemos pelas notas «em volta da obsessão e da escrita», preparadas para um colóquio internacional de «jovens narradores», em que Mallard se cruzou, entre outros, com o dominicano Junot Díaz, autor de A Breve e Assombrosa Vida de Oscar Wao, excelente romance de estreia que ganhou o Pulitzer de Ficção em 2008. Na sua intervenção, Mallard começa por lembrar uma célebre frase de Freud – «a cultura engendra a neurose» – com a intenção de a inverter, mostrando que a neurose também pode engendrar a cultura; ou, mais especificamente, a literatura. Pelo simples facto de que «complicam o problema humano», os desequilíbrios (psicológicos ou de personalidade) serão sempre propícios à criatividade literária. Mallard concentra-se sobretudo no modo como o comportamento obsessivo condiciona, desbloqueia ou alimenta o trabalho de escrita de alguns autores. Francis Ponge, por exemplo. Durante quase um terço da sua vida, de 1942 a 1967, o autor de O Partido Tomado Pelas Coisas procurou fixar com palavras a natureza escorregadia e evanescente do sabão, até que reuniu em livro o somatório de todas essas tentativas e «ângulos de ataque», as «declinações sucessivas» de um mesmo tema, com «intuições, avanços, naufrágios, contra-sensos». Houve no projecto de Ponge tanto de obsessão como de perseverança, resume Mallard, mas acima de tudo houve uma «lição de escrita».
 
Caso distinto é o de Juan Rulfo, em que o temperamento obsessivo, mais do que conduzir à persistência num tema, é um «garante da forma». Entre a primeira e a segunda edição de A Planície em Chamas (edição portuguesa da Cavalo de Ferro), Rulfo introduziu pequenas variantes lexicais que são exemplos do mot juste flaubertiano, reflectindo uma vontade de levar até ao limite a coerência textual e de fixar «definitivamente» a prosa literária. O que Mallard pretende, em última análise, é estabelecer para si mesmo uma praxis da escrita que passa pela máxima exigência estética. Um texto só deve ser publicado quando as partes que o constituem encontraram a sua forma final. E isso implica uma «batalha contra a linguagem». Uma batalha sem tréguas. E das duas uma: ou se consegue dominá-la, ou se acaba dominado por ela. Seja como for, para Mallard escrever é sempre «servir a linguagem», porque «desde que Borges demonstrou a existência da página perfeita» temos o dever de aspirar a essa perfeição.
 
Costuma dizer-se que entre a teoria e a prática há sempre uma certa distância, mas isso não se aplica a Alain-Paul Mallard. Em Évocation de Matthias Stimmberg, ele cumpre à risca o que defende nas notas. Máximo rigor verbal, máximo depuramento, máximo efeito literário. A primeira versão destes contos tinha 200 páginas; a final, pouco mais de 50. A reescrita foi tão furiosa que o escritor colombiano Alvaro Mutis terá dito: «é preciso arrancar-lhe o livro antes que ele desapareça». Como o sabão de Francis Ponge.
 
José Mário Silva - Publicado no blog  Bibliotecário de Babel 
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publicado por ardotempo às 17:50 | Comentar | Adicionar

Editor: ardotempo / AA

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