Sexta-feira, 31.07.09

Conexões Infinitas

Mostra de fotografias de Gilberto Perin

 

CONEXÕES INFINITAS
 
 
Durante uma pesquisa de imagens e de videos realizadas em conjunto com o diretor de tv e cinema Gilberto Perin sobre o assunto da televisão para o projeto de um livro, deparei-me na tela de seu monitor de trabalho com a passagem de algumas fotografias muito interessantes, numa sequência constante. Vez ou outra uma imagem de fina escolha, de sensibilidade, às vezes com um sutil toque de humor mas revestida sempre de um enquadramento original e sentido estético. Coisa de um profissional da imagem. Aquilo me chamou a atenção. Perguntei quem era o autor e Perin respondeu-me que eram fotografias dele, imagens que fazia para si, na sua cidade e em outras cidades. Pedi-lhe então que me enviasse um conjunto delas e analisei-as detidamente. Estava diante de uma obra de qualidade, de grande apuro estético e técnico. Um bom olho.
 
 
Imaginou-se então uma mostra em local ideal, o Centro Cultural CEEE Erico Verissimo, que vem construindo uma série de exposições criteriosamente escolhidas e muito bem montadas, especialmente em fotografia de autoria.
 
 
 
Uma fantástica revelação de uma obra amadurecida e personalizada, com critérios de escolha estruturados em convicções temáticas: as pessoas e seus mundos particulares, o inusitado das paisagens urbanas, um surpreendente fio condutor com o qual o olhar peculiar do fotógrafo unia os cenários mais díspares. Nova York e Porto Alegre. Taormina e Helsinki. O fotógrafo carregava consigo os seus espelhos e suas interpretações onde quer que fosse.
 
 
Ele deixou-me um conjunto de imagens para formar a mostra e foi viajar mais uma vez. Escolhi 37 fotografias e estava com a mostra praticamente selecionada quando ele telefonou-me da Tunisia e comunicou que havia alguma coisa nova, talvez.  Eram 1.970 novas imagens e os seus vários temas bem discorridos. Ali estava o humor finissimo, o tema do testemunho da janela indiscreta, os retratos (e o fotógrafo expõe-se totalmente, é corajoso, chega bem perto, alguns fotografados não o percebem, outros o aceitam bem, uns não reagem tão bem, escondem-se atrás de livros, das mãos, em véus e chapéus, dentro dos próprios olhos). Estava ali também o tema dos cenários gráficos, a conexão entre as pessoas e as coisas daqueles mundos, como o fotógrafo as via.
 
 
Conexões. Conexões Infinitas. Gilberto Perin falou disso desde o deserto, do centro da cratera do vulcão, dos declives das ladeiras, do abrigo das sombras de arruinadas colunas imperiais. A nova escolha de imagens seguiu essa idéia do fotógrafo, a de juntar os elos, oferecer aos que olham as suas imagens uma quantidade de significados, aparentemente desconexos. mas que possuem os recortes precisos para que os observadores reconstruam, eles mesmos, os próprios puzzles individuais.
 
 
Mostra: CONEXÕES INFINITAS
Fotógrafo: © Gilberto Perin
Local: Centro Cultural CEEE Erico Verissimo
Porto Alegre RS Brasil
De 04 de agosto a 19 de setembro de 2009
publicado por ardotempo às 03:40 | Comentar | Adicionar
Sexta-feira, 24.07.09

A memória é de granito

Fotografia

 

 

 

Mário Castello - Fotografia - Largo da Memória (São Paulo SP Brasil), 2009

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Poste amarrado

Itaci Batista

 

 

Itaci Batista - Fotografia - O poste amarrado (São Paulo SP Brasil), 2009 

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Quinta-feira, 23.07.09

O conhecimento

Fotografia

 

 

 

 

Gilberto Perin - Fotografia - O conhecimento - Série Conexões Infinitas (Lisboa - Portugal), 2009

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Terça-feira, 21.07.09

Anunciar o céu com as asas

Cri cri cri foguete
 
António Lobo Antunes
 
Chegam caixotes de livros pelo correio, chegam revistas literárias estrangeiras e eu pasmado: parece que não há quem não escreva neste mundo, romances sobre romances sobre romances, poesia, ensaio, biografia, contos, memória, o raio que o parta. E depois estudam-se uns aos outros, têm ideias, opinam, dissertam acerca de influências, presenças, ausências, ritmos, estruturas, aproximam nomes, afastam-nos, cagam postas, falam, compreendem, etiquetam, classificam, arrumam e tudo isto me dá um enjoo só comparável ao enjoo que me dão os jornais, não há quem não reflicta, não ache, não julgue, não decida, azedos, simpáticos, pretensiosos, analíticos, cultos, afirmativos, jocosos, o que tem esta tralha a ver com a vida, o que tem esta tralha a ver comigo, não me interessa, passem muito bem, adeuzinho e lá ficam eles a resmungar, a gesticular, a sussurrar, a medir. Não era assim que eu imaginava quando comecei, não me interessa, não quero. Interessam-me os meus amigos
 
            (tão poucos)
 
            interessa-me que haja sol, gosto de estar vivo embora, tão frequentemente, não saiba o que fazer com a vida, não pretendo passar mais tempo debaixo de tanta lombada e ensurdecido por tanta berraria, interessa-me o silêncio, o ventinho nas árvores, a Serra da Estrela, as pobres coisas que à noite não existiam e amanhecem nos passeios, até frigoríficos, até poltronas, a senhora internada no Hospital Miguel Bombarda que em lugar de
 
            - Bom dia
 
            me cumprimentava com a frase
 
            - Cri cri cri foguete
 
            cumprimentava o mundo inteiro com a frase
 
            - Cri cri cri foguete
 
            e trancava-se a seguir numa atitude feroz, deve ter morrido há que tempos e suponho que insiste
 
            - Cri cri cri foguete
 
            num cemitério qualquer a espantar os restantes defuntos, eles indecisos
 
            - O que significará cri cri cri foguete?
 
            e é simples, cri cri cri foguete significa cri cri cri foguete, nunca encontrei cri cri cri foguete em nenhum livro, em nenhuma revista, não consta, e no entanto que importante cri cri cri foguete, que decisivo. O que eu aprendi no Hospital Miguel Bombarda meu Deus, cri cri cri foguete abarca tudo. Lembro-me de mencionar ao meu falecido pai o cri cri cri foguete, do cachimbo dele se tornar mais rápido, de comentar passados tempos
 
            - Cri cri cri foguete é extraordinário
 
            continuando a ruminar nisso, no caso de se ter mantido cá em cima ainda ruminaria consoante eu rumino, na papeleta dela a profissão costureira de chapéus, um trabalho que me põe a sonhar, calculo já não existirem costureiras de chapéus, pessoas úteis, de longe em longe uma irmã visitava-a e ficavam de mão dada, caladinhas, só o
 
            - Cri cri cri foguete
 
            quando a irmã chegava, acabada a hora da visita ia-se embora muda, sob os plátanos, a sombra dos plátanos quase horizontal, comprida, a sombra dos plátanos compridíssima, começavam a servir o jantar em carrinhos de alumínio que tremiam, tremiam, longos corredores melancólicos, a noite, gatos e gatos em torno da cozinha, o mistério das plantas invisíveis nos canteiros soprando sem voz o nosso nome
 
            - Toma conta de mim
 
            pediam elas
 
            - Toma conta de mim
 
            porque não há maior desamparo que o das flores no escuro. Os pombos no telhado da garagem, de cabeça sob a asa conforme os motociclistas guardam o capacete sob o braço, a ambulância velha a que faltava uma roda, em cujos bancos não me importava de dormir se não dormissem ratos, lixo, bicharada. Devia tê-la roubado e trazido para o meu quarto, ratos incluídos, com autorização para comerem a biblioteca, os lençóis, o tapete, a roupa dos armários, facturas, manuscritos, cartas de tradutores com dúvidas
 
            (se lhes falasse das minhas...)
 
            retratos, condecorações, diplomas, prémios, as loiças de Rafael Bordalo Pinheiro, a televisão apagada. Um cabeleireiro aqui perto tem escrito na montra um resumo dos seus serviços, que inclui unhas de gel, drenagem linfática e banho de lua. Banho de lua é quase tão notável como cri cri cri foguete. Fui perguntar: consiste em pôr a pessoa toda loira, do cocuruto aos pés, só não compreendo lá muito bem o que tem isso a ver com banho e com lua. Se um dia destes cruzarem um sujeito amarelo-maçaneta sou eu. Não voltei ao hospital e se voltasse quem me conhecia? Corredores, corredores. Um internado a perseguir um enfermeiro coxo. O médico que trazia o molho de piripiri na algibeira para condimentar o almoço do refeitório. Gente a pedir cigarros. O Dinis Machado, se lhe pediam cigarros:
 
            - Não posso, só tenho dezoito.
 
            Escrevíamos cada um na sua ponta da mesa e o texto dele chamava-se Fado Alexandrino: ficava óptimo no meu, deu-mo. Havia alguma coisa que o Dinis não desse tirando os cigarros, difíceis de dar porque não os tinha nem os fumava: fumava uma espécie de charutitos, vestia-se como um gangster da Lei Seca, as patilhas, o penteado. Ao sorrir os olhos pareciam as ranhuras das caixas das esmolas e eu
 
            - Deixa-me enfiar uma moeda no teu sorriso.
 
            Com o Dinis falava de livros, tínhamos a mesma linguagem, a avó dele explorava uma casa de raparigas e o Dinis, em criança, almoçava com as meninas, aprendeu segredos, aos cinco ou seis anos, que demorei tanto tempo a encontrar, quando, em adolescente, uma rapariga se despiu para mim tive vontade de ajoelhar, escutei as palavras com que Deus advertiu Moisés
 
            - Descalça-te que o chão que pisas é sagrado
 
            e comovi-me até às lágrimas dado que um corpo feminino é um milagre que nenhum homem merece. E agora, de repente, apareceu-me a imagem da minha mãe a dar de mamar a um dos meus irmãos, de pálpebras descidas, com uma fralda a cobrir-lhe quase todo o peito. E envergonha-me que nós, que não nascemos mulheres, sejamos capazes de sujar tudo. Anunciar à rapariga das tocas o céu com as asas.
 
 
 
 
© António Lobo Antunes
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Corpos antigos de Hasselblad pesam em demasia

 A Lua 

 
Dizem e escrevem que homem chegou à Lua há quarenta anos atrás. Em trinta anos de descoberto, por volta do ano de 1530, o Brasil tinha umas vilas aqui e ali, nuns portos improvisados em algumas baías e em certas embocaduras mansas de rios tropicais. Eram umas aglomerações de casarios precários e Portugal já começara a saga de sua colonização. Sempre foi muito arriscado cruzar o vasto oceano (e ainda hoje existem perigos inesperados a tornar a travessia dificil e incerta). Mas o ciclo da História fazia-se incontornável e aos primeiros seguiram-se outros e depois, muitos. É assim na vida e tudo tem seu curso, em evolução cumulativa. Nada fica igual em trinta anos. Mas o cenário imaginado por Stanley Kubrick em 2001, surpreendentemente, não aconteceu. Ao contrário, não aconteceu absolutamente nada na Lua.
 
Fala-se em  ausência de interesse comercial, das dificuldades de exploração mineral e das impossibilidades de viabilização econômica. Com toda a certeza esse deve ser esse o motivo, de fato. Mas quem nasceu de 1979 em diante, tem todo o direito de não acreditar que alguém chegou à Lua, se ninguém jamais lá voltou ou sequer pôde imaginar voltar. À propósito, não seria tudo bem mais fácil hoje, com a ajuda dos sofisticadissimos computadores e da leveza da miniaturização de todos os componentes necessários para uma nova façanha daquelas? Como foi possível em 1969 e agora já não é mais possível?
 
O que me intriga é ver o notável esforço do foguete Saturn a empurrar, para  vencer a atmosfera e gravidade terrestre (um foguete que mais parecia um arranha-céu em toneladas de combustível potente) e levar penosamente o pequeno módulo e a cápsula dos astronautas para sua órbita, comparado-se com a extrema facilidade com que decolou alguns dias o frágil artefato, o módulo de pernas de inseto, com pouco combustivel e nenhum teste prévio, a alçar-se em vôo de helicóptero e escapulir suavemente da tênue gravidade lunar. E de lá partiram gloriosamente os astronautas hermeticamente mascarados  em seus capacetes de visor negro, depois de emitir suas frases solenes, deixando alguns corpos de máquinas fotográficas Hasselblad cujo peso interferiria dramaticamente no eventual sucesso da decolagem faceira. Quedaram-se olvidados ao lado da bandeira que, curiosamente, balançava ao sabor do vento lunar, nos vídeos gravados do evento. Esses vestigios lá restaram para serem reencontrados no futuro pelos descendentes dos nascidos depois de 1979.
 
Veja o vídeo da chegada do homem na Lua.
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Segunda-feira, 20.07.09

Retrato

Pintura

 

 

 

 

Lucian Freud - Pintura - Retrato de Sua Majestade Rainha Elisabeth (Londres - Inglaterra UK) 

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Bronze de Giacometti

 Escultura

 

 

 

Alberto Giacometti - Escultura - Busto de Diego Giacometti (Paris França), 1955

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Espaço Construtivista - São Paulo

Fotografia

 

 

 

 

Mário Castello - Largo da Concórdia - Fotografia (São Paulo SP Brasil), 2006

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A paleta de vidro

Fotografia

 

 

 

 

Pierre Yves Refalo - Fotografia - A paleta de vidro (São Paulo SP Brasil), 1989

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Sábado, 18.07.09

Bastidores, de João Fahrion

 Pintura

 

 

 

Bastidores - João Fahrion - Pintura - Óleo sobre tela (Porto Alegre RS Brasil), 1951

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A paleta mineral

As cores da terra

 
José Saramago
 
As mãos, quando trabalham a terra, confundem-se com ela. Há pintores que se acercam à superfície do suporte com as mãos manchadas das cores da terra. Há pintores que não podem nem nunca quereriam esquecer as cores da terra quando se preparam para pintar um rosto, um corpo despido, o brilho de um cristal, ou nada mais que duas rosas brancas numa jarra. A luz também existe para esses pintores, mas apreendem-na como se ela lhes tivesse subido do interior da terra obscura.
 
Ao distribuí-la na tela, ou no papel, ou numa parede, o que eles fazem aparecer são os tons surdos e quentes dos barros, os negrumes do húmus, o pardo das raízes, o sangue do almagre. Pintam o humano e a sua contingência com as cores da terra porque essas é que são as cores fundamentais, não as outras.
 
De um retrato que tenha sido pintado pelas cores da terra (como os pintava Cézanne) nunca se diga que está parecido, diga-se, sim, que é idêntico, idêntico ao original, idêntico na sua última substância: neste caso, a maior ou menor semelhança que seja capaz de oferecer-nos será o que menos deva importar. Uma figura pintada com as cores da terra terá sempre no rosto a inteireza áspera do sílex, nos cabelos os redemoinhos que o vento desenha e move nas searas, e as mãos aparecer-nos-ão como se tivessem acabado de erguer do chão os seus frutos mais profundos. As cores, todas as cores, as da terra e as do ar, sempre procuraram as formas de que precisavam para serem percebidas mais além da sua primeira manifestação. As cores foram sempre o que desafiou ou conteve o ímpeto contraditório que se encontra implícito nas formas, campo eterno de um conflito entre as agitações caóticas da rebeldia e as passividades da submissão ao costume.
 
Tudo isto será certamente menos perceptível nas pinturas que, havendo-se proposto como miméticas transposições do “real” aparente, aspiram, acima de tudo, a ser “reconhecidas”, “identificadas”, “classificadas”, porém, essas, mais tarde ou mais cedo, acabam por ser presas da acção desgastadora de um olhar que pouco a pouco as vai “neutralizando”. Pelo contrário, ao defender-se de formas facilmente identificáveis com as representações comuns da realidade circundante, a arte abstracta, quer directa, quer de opção tendencial, “resguarda” e “liberta”, em princípio, a independência relativa da cor, não a “estrangula” no aperto constringente de configurações mais ou menos previsíveis ou de modelos social e consensualmente correctos.
 
Não foi por mera casualidade que utilizei a palavra “tendencial” como característica de uma certa prática pictórica que, apesar de instalada sem equívocos naquilo que, generalizando demasiado, chamamos arte abstracta, se recusa a cortar completamente as pontes com o mundo dos signos e dos símbolos, quer arquetípicos, quer modernos.
 
Ela brotou espontaneamente no meu espírito enquanto contemplava, de olhos deslumbrados e tomado por uma emoção poucas vezes experimentada antes, as pinturas murais com que Jesús Mateo cobria as paredes frias da igreja de San Juan Bautista de Alarcón. Era Jesús Mateo um pintor abstracto “tendencialmente” realista? Ou, pelo contrário, um pintor realista “tendencialmente” abstracto?
 
E essas pontes de ligação a que acima fiz referência seriam somente praticáveis para comunicar a arte “abstracta”com os signos e os símbolos gerados nas diversas indagações de que a realidade tem sido objecto, ou existiriam igualmente para comunicar a arte “realista” com um universo de abstracções em contínua expansão? Pensei então que Jesús Mateo, ao mesmo tempo que se havia libertado das ataduras condicionadoras de um realismo estrito para se entregar a um trabalho sobre formas também elas “tendencialmente” livres, embora em meu entender acatando sempre a lógica cromática, havia logrado, graças à introdução inteligente e criteriosamente medida de signos e símbolos sem custo identificáveis, fundir em uma expressão única, e quase diria uníssona, como um coro a plenas vozes simultâneas, como um políptico perspectivamente reunido em um só ponto de fuga, as enormes paredes que subiam do chão arrastando consigo toda as cores surdas da terra para ir ao encontro das cores luminosas do ar. Perante o ciclópico assombro, conceitos como abstraccionismo e realismo perdem algo do seu significado autónomo corrente, tornam-se mão esquerda e mão direita modelando em harmonia o mesmo barro.
 
Não sei se a igreja de San Juan Bautista de Alarcón virá a ser olhada como a Capela Sixtina do nosso tempo, mas sei, tanto por ciência que creio certa como por intuição divinatória, que o pintor Jesús Mateo nasceu da mesma árvore genealógica que deu os seus melhores frutos em Hyeronimus Bosch e Brugel, o Velho.
 
Tal como eles, Jesús Mateo explicou o homem. Pelo visível e pelo invisível.
 
© José Saramago - Publicado no blog O Caderno de Saramago
 
 
Auto-retrato, de João Fahrion - Pintura, óleo sobre placa de madeira (Detalhe)
publicado por ardotempo às 17:59 | Comentar | Adicionar

Água engarrafada: isso é bom ou ruim?

Cidade australiana proíbe venda de agua engarrafada
 
Com uma votação quase unânime em uma reunião da comunidade, os moradores da pequena cidade turística australiana Bundanoon iniciaram um debate mundial sobre os efeitos sociais e ambientais da água engarrafada que colocou a indústria de bebidas na defensiva.
 
 
 
Autoridades estaduais e municipais nos EUA vêm diminuindo o uso de água engarrafada em escritórios públicos nos últimos anos, alegando diversas preocupações, dentre elas a energia usada para produzir e transportar as garrafas e o aumento da desconfiança do público na água encanada. Até onde sabem os ativistas, Bundanoon é a primeira cidade no mundo a proibir a venda de água engarrafada.
 
Localizada nas terras altas no sudeste de Sydney, Bundanoon é uma cidade pacata de jardins arrumados e chalés graciosos cercados por casas de campo de cidadãos urbanos ricos. É o típico lugar onde desconhecidos conversam nos bancos do parque ao longo da pitoresca rua principal e as pessoas do lugar deixam flores no memorial de guerra local.
 
De acordo com Huw Kingston, proprietário do Ye Olde Bicycle Shoppe e líder da campanha, a proibição não começou como cruzada ambiental. Começou quando a empresa engarrafadora pediu permissão para extrair milhões de litros de água do aquífero local.
 
A princípio, os moradores não gostaram da ideia de caminhões de água atravessando suas ruas tranquilas. Mas, com o crescimento da oposição, muitos moradores começaram a questionar o próprio conceito de transportar água por caminhão por cerca de 160 km ao norte, para uma engarrafadora em Sydney, para depois ser transportada para outras partes - possivelmente até de volta a Bundanoon - para ser vendida.
 
"Tomamos consciência, enquanto comunidade, do que é essa indústria", disse Kingston. "Então nasceu a questão: se não queremos uma fábrica de extração em nossa cidade, talvez não devêssemos mesmo vender o produto final".
 
Uma dezena de ativistas se reuniu e convocou uma reunião da comunidade. Dos 356 moradores que apareceram para votar com um aceno de mão, apenas um fez objeções.
 
A proibição é inteiramente voluntária. Com o apoio do público, os seis principais comerciantes de alimentos da cidade concordaram em tirar a água engarrafada de suas prateleiras a partir de setembro. Eles planejam recuperar suas perdas vendendo garrafas reutilizáveis e baratas que poderão ser enchidas em fontes e bebedouros que serão distribuídos pela cidade.
 
Alguns dos 2.500 moradores da cidade dizem que apoiam o projeto porque se preocupam com os efeitos dos agentes químicos das garrafas plásticas; alguns veem como demonstração positiva contra a engarrafadora.
 
Uns não acreditam que a prefeitura conseguirá manter as novas fontes, enquanto outros se preocupam com as implicações para a saúde de deixar apenas alternativas açucaradas nas prateleiras das lojas.
 
"Não vejo porque se deve teimar apenas com a água", disse Trevor Fenton, morador aposentado de Bundanoon. "O que eu gostaria era de vê-los se livrarem de todos os refrigerantes, mas eles nunca fariam isso."
 
Os ambientalistas vêm ganhando força na luta contra a água engarrafada. Além das novas restrições de governos estaduais e municipais nos EUA, muitos restaurantes importantes também começaram a substituir água mineral importada por água da bica. Recentemente, um comitê do Congresso norte-americano debateu se não deve aumentar a regulação sobre a indústria da água engarrafada, após revisar dois novos estudos que questionavam se a água engarrafada era mais saudável do que a da bica.
 
A repercussão do assunto irritou a indústria, que envolve quase US$ 60 bilhões (em torno de R$ 120 bilhões) por ano no mundo e cerca de US$ 400 milhões (R$ 800 milhões) por ano na Austrália. Grupos da indústria dizem que é injusto discriminar a água engarrafada quando muitos outros produtos -como fraldas descartáveis e produtos importados, queijo e vinho - têm igual ou maior impacto no meio ambiente.
 
"Precisamos manter o produto em perspectiva", disse Parker. "Há dezenas de milhares de produtos no setor de bens de consumo e há um vasto número com uma pegada de carbono maior do que a água engarrafada."
 
A questão é sensível. No dia da votação em Bundanoon, o governo de New South Wales anunciou que ia parar de comprar água engarrafada, levando o ministro do meio ambiente a instar outros Estados a fazerem o mesmo. As medidas geraram uma enxurrada de editorais nos jornais e em programas de rádio no final de semana em toda a Austrália.
 
Publicado no UOL - Universo On Line
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Sexta-feira, 17.07.09

A foto da foto

A bica está vazando 

 

 

 

 

Gilberto Perin - Fotografia - A fotografia do fotógrafo Boaz Lyu numa certa noite em Roma (Roma - Itália), 2009

publicado por ardotempo às 00:19 | Comentar | Adicionar

Fotografia - Boaz Lyu

Fotografia 

 

 

 

 

Boaz Lyu - Fotografia - Coliseu (Roma - Itália), 2009 

Blog de Fotografia Boaz International

publicado por ardotempo às 00:16 | Comentar | Adicionar
Quinta-feira, 16.07.09

Escultura no Centro Cultural

Fotografia

 

 

Itaci Batista - Escultura - Fotografia (São Paulo SP Brasil), 2009

publicado por ardotempo às 21:08 | Comentar | Adicionar

Antes de nascer o mundo - Mia Couto

Mia Couto - Recomendado

 

Antes de nascer o mundo (ou... Jesusalém)

 

O novo livro de Mia Couto: veja o vídeo sobre o livro

publicado por ardotempo às 17:14 | Comentar | Adicionar
Quarta-feira, 15.07.09

Estátuas vivas, celebridades anônimas

Eu e o meu plinto
 
Ivan Lessa
 
Todos querem saber o que é que eu vou fazer lá em cima do plinto da praça Trafalgar.
Plinto. Nada de muito complicado, basta ir ao novo dicionário Houaiss contendo as obrigações da nova reforma ortográfica brasileira e custando apenas R$ 250.
 
Plinto é pedestal. Ponto. A praça Trafalgar, ou Trafalgar Square, em bom português, tem bem no meio um plinto com o Almirante Nelson, entre pombos, contemplando o horizonte, enquanto turistas o contemplam e pombos o ultrajam.
 
Em três outros plintos, três personalidades de renome que ninguém sabe direito quem são, não interessa e não vem ao caso. O quarto plinto, o da quina noroeste, está há alguns anos vazio da silva, já tendo dado margem para muito esquema artístico ou ufanista e, agora, mais uma vez, encontra-se nas garras na comunidade dita criativa.
 
Antony Gormley, escultor, bolou uma boa. Durante cem dias, 2,4 mil pessoas têm o direito de ficar uma hora lá no alto do plinto fazendo o que bem entender. Contanto que não seja nada de ilegal, claro.
 
 
O esquema criativo leva o nome de One & Other (“Um e Outro”). Na segunda-feira de manhã, um guindaste conduziu à sua hora e seu plinto de glória Rachel Wardell, uma dona de casa de 35 anos que, não se sabe direito como, dedicou seus 60 minutos à arrecadação de fundos beneficentes para a Sociedade Protetora de Animais.
 
Nos próximos três meses de arte pública, as outras 2.399 pessoas, escolhidas sem qualquer critério preestabelecido, darão o melhor de si para os visitantes ao célebre cartão-postal que constitui a praça em questão.
 
Outra Rachel, esta Elliott, gorduchinha, como mostraram os jornais, se exibirá totalmente despida. Ela tem uma pequena tatuagem em seu braço esquerdo, muitos notaram. Rachel pretende ainda criar algumas contas, pois este é seu passatempo favorito. Logo depois de tirar a roupa, fica subentendido.
 
Uma senhora lá do norte, de Newcastle, pretende ficar tricotando durante uma hora. Vestida, está claro.Suren Sereneviratne, de 22 anos, estudante, londrina, tem a firme intenção de subverter os cem dias de arte pública ficando, no tempo que lhe cabe, absolutamente imóvel naquelas alturas. Como uma estátua. Não deve ter notado a redundância.
 
Um cavalheiro do aprazível bairro de Hampstead, no norte de Londres, pretende se vestir metade “Grã-Bretanha Multicultural”, metade quadro da “Fraternidade Pré-Rafaelita”. Difícil visualizá-lo.
 
Um contador de Newcastle dará um pulo à capital e durante sua hora lerá trechos selecionados da Bíblia. Amém.
 
E assim por diante.
 
Amigos, e principalmente inimigos, me aconselham – ainda há tempo – a candidatar-me a um tempinho no plinto. “Vai que é uma boa”, garantem-me. Paro e considero. Não, não é uma boa. Mas se eu tivesse direito a uma hora de plinto, pergunto a mim mesmo, em posição da estátua “O Pensador”, de Rodin, o que faria lá de cima diante de todas aquelas pessoas?
 
Depois de muito refletir, resolvi a questão: eu botaria terno e gravata, coisa que não faço há 24 anos, e ficaria fazendo minha famosa imitação do escritor José Saramago, de quatro, procurando no chão o par de óculos que acabara de lhe cair do rosto. Arte, além do mais pública, é duro.
 
Encerro voltando-me, como sempre volto, aos queridos Brasil e Rio de Janeiro. Fiquei sabendo que, desde 2 de julho, obras de arte de sete franceses ocupam a galeria a céu aberto de Copacabana, Ipanema e Leblon.
 
São responsáveis por 20 painéis de dez metros de altura em dez pontos da orla. Mais uma manifestação, como a da praça londrina, de arte pública. Mas com a picardia que é só nossa e de mais ninguém.
 
Como o evento ocorre no Rio de Janeiro, Brasil, e os responsáveis pelas obras expostas são todos franceses, qual o nome que escolheram para a ocasião? Claro: “Street Biennale”. Nós somos engraçados. Funny, drôles, divertenti.
 
Ivan Lessa - Publicado no blog BBC Brasil

Imagem: © Antony Gormley 

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Segunda-feira, 13.07.09

Aldyr G. Schlee e seus livros novos

Na Palavraria

 

No sábado, dia 11 de julho, Aldyr G. Schlee falou com alegria e prazer sobre seus dois novos livros, Don Frutos (romance) e Nos limites do Impossível (contos), ainda inéditos. Foi igualmente um prazer e uma alegria a todos os que estiveram na Palavraria naquela noite iluminada para ouvi-lo. Poetas, músicos, compositores, cineastas, fotógrafos, pesquisadores, artistas, historiadores, cientistas, estudantes e leitores permaneceram ali, imantados, sem se dar conta da passagem do tempo. Foram muitos a escutar a conversa cativante e erudita do escritor, que discorreu com naturalidade sobre os andaimes literários de suas criações recentes e também sobre a obra de Mario Benedetti e Simões Lopes Neto.

 

O escritor foi recebido carinhosamente pelo seu público leitor e pelos anfitriões da Palavraria Livraria & Café, a simpática e aconchegante livraria de Porto Alegre; Carla, Carlos e Luiz Heron, estes os anfitriões atentos que se esmeraram na confraternização e na comunhão literária, de altissimo nivel.

 

 

 

 

Imagem: Aldyr Garcia Schlee e Luiz Heron, da Palavraria

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Fotografia

Graciela Iturbide, fotógrafa mexicana

 

 

 

 

Graciela Iturbide - Fotografia - "Epicentro de Templos Hinduístas" (Khajuraho, India), 1998 - Prêmio Hasselblad Foundation 

 

Publicado no blog Arte Photographica

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Van Gogh na Bela Vista SP

No Bexiga

 

 

 

Mário Castello - Fotografia - Van Gogh no Bexiga (São Paulo SP Brasil), 2009 

publicado por ardotempo às 16:03 | Comentar | Adicionar
Domingo, 12.07.09

Chapéus

Crónica de amor
 
António Lobo Antunes
 
 
 
 
Os cães não param de ladrar no jardim, achas que alguém está a tentar roubar-nos? O portão é tão fácil de abrir, as janelas nem grades têm, qualquer pessoa entra aqui com um empurrãozinho e depois os cães não fazem mal a ninguém, só servem para sujar tudo e estragar os canteiros, estou para saber porque carga de água os comprámos sem falar na despesa com o veterinário e a comida, na porta do alpendre toda estragada em baixo, no cocó espalhado na garagem que nos obriga a fazer uma gincana até chegarmos ao carro. E o cheiro, meu Deus, mesmo os miúdos tresandam a cão, respondes-me que todos os miúdos tresandam a cão a começar pelos que não têm cão, faz parte da natureza deles, depois crescem.
 
O problema é que demoram eternidades a crescer e enquanto crescem e não crescem vão escavacando tudo, pés no sofá, tampos riscados, o chichi fora da retrete, molho sempre o rabo quando me sento no aro. E se a gente desse os miúdos de mistura com os cães ou os deixasse na rua na esperança que a camioneta da Câmara os leve? Ficava um de nós lá fora, a tomar conta por causa dos ladrões, metade da noite eu, metade da noite tu, escondidos num buxo, prontos a morder, peço ao dentista que me aguce os pivôs e de pivôs aguçados corta-se madeira com eles, quanto mais um braço, uma perninha. Não me espreites assim que não te faço mal nem estou maluca, os cães dão-me cabo dos nervos e uma pessoa exagera, diz coisas que não pensa, arrepende-se. Bichos e crianças são mais ou menos a mesma coisa sobretudo aos fins de semana, eu o tempo inteiro com eles e tu no interior do jornal a tapares as orelhas com notícias, a leres os suplementos, a encheres o universo de papel, há páginas que caem e avançam tapete fora e depois o jornal é gordo e eu nem um olhar mereço, já nem falo num sorriso, um olharzito de cacaracá, uma frase de tempos a tempos, um elogio.
 
Cortei o cabelo, reparaste? Conheces estes brincos? O bâton rosado? Pensas que os homens não se interessam por mim? Ainda ontem me deram trinta e seis anos, não interessa quem, podes perguntar que não respondo. Estás a ler o jornal ou a dormir? Ainda ontem me deram trinta e seis anos, palavra, e tu há uma semana sem me tocares, trinta e seis anos, compreendes, repara nesta cintura, neste peito, o pescoço lisinho, as pernas sem uma variz, celulite e estrias viste-as, se me apanhassem nua os trinta e seis baixavam para dezanove ou vinte, com um perfume que eu cá sei para dezoito até, nem uma jeitosa de dezoito anos te fala à alma pois não, dezoito anos, palpita, e não palpitas, se um ladrão me levar não dás conta, pensas que tens alguma graça, tu, quase careca, essa barriga, pensas que dizes coisas que se aproveitem, às vezes, ao falares, ficas com esponjinhas de cuspo nos cantos da boca, não existe pior friagem para uma mulher que esponjinhas de cuspo nos cantos da boca, só de lembrar isso enjoa-me, nem sei como aguento, o que terei visto em ti, daqui a nada arranco-te o jornal das mãozinhas e para quê arrancá-lo se arrancando-te o jornal dou contigo e com as esponjazinhas, com os pêlos do nariz que bem podias cortar, quando tentei cortar-tos começaste logo a torcer-te
 
- Estás a fazer-me cócegas
 
e não estava a fazer cócegas nenhumas, estava a  por-te decente, aposto que na empresa se metem contigo e te chamam gorila, pêlos no nariz, pêlos nas costas, onde é que tu não tens pêlos e a parva da minha irmã a achar-te viril, se ela soubesse do que a loja gasta, como posso ter ciúmes de ti se nem para este peditório dás, há pastilhas na farmácia que ajudam, se te estenderes com uma amiguinha ela
 
- Então?
 
e tu, como fazes comigo
 
- Isto é como um avião, custa a descolar mas depois voa muito alto
 
e voa muito alto o tanas, mal deixa de sentir a pista aterra, lá vem a desculpa do costume
 
- Preocupações no emprego
 
tento ajudar na descolagem e népia, por mais que me esforce, e só falta dar pinos, o avião poisado, se me perguntassem
 
- Como é que engravidou duas vezes?
 
a única resposta verdadeira seria
 
- Como Nossa Senhora
 
e juntando-nos às duas, a ela e a mim, o Espírito Santo fez obra e graça três vezes, nada mal para um pombo, não estendas o garfo para o cinzeiro que em vez de me acertares com ele vais partir a cristaleira e os cálices de rebordo doirado são meus, vai na volta os miúdos, daqui a uns anos, ainda saem a ti nesse aspecto visto que fisicamente, em lugar de se parecerem com o Espírito Santo, que era a obrigação deles, se parecem contigo, deixa o cinzeiro em paz, deixa o anjinho de mármore em sossego, deixa o atiçador da lareira no sítio que não sou frango de espeto, sou mulher, repara neste peito, nesta cintura, neste pescoço lisinho, nestes tornozelos estreitos, deixa cá ver como está o avião, não me empurres, fechadinho no hangar coitado, eu já desconfiava e de chocolate ainda por cima porque amoleceu com o calor, os cães não param de ladrar no jardim, achas que alguém está a tentar roubar-nos, se um gatuno me levasse era feliz garanto-te, quarenta e cinco anos e dão-me trinta e seis, o médico a preencher a ficha
 
- quarenta e cinco não acredito
 
e ao tirar a blusa para a auscultação ainda acreditou menos e isto sem estéticas, sem postiços, tudo meu, tudo firme, não preciso de ginásios, não preciso de dietas, o médico para mim
 
- Almoço sozinho já viu a minha tristeza?
 
e eu com pena da tristeza dele, com pena do metro e oitenta, com pena dos olhos verdes, realmente há pessoas infelizes, a cabeça cada vez mais perto do estetoscópio, a respiração dele na minha espinha, a impressão que o queixo me roçou uma ou duas vezes no ombro, não afirmo que roçou, afirmo que a impressão, a enfermeira ao trazer-lhe uns papéis
 
- Algum problema senhor doutor?
 
e eu aflita com o nervoso do homem, olhos verdes com pestanas compridas, um after-shave mais caro que o teu que para os after-shaves tenho olfacto, só não tive olfacto ao ir na tua cantiga, cuidado com o atiçador que te magoas, até parece que queres jogar à espada comigo, acaba com as fitas, senta-te no sofá, agarra no jornal que para isso ainda serves, agarra no jornalzinho, não me apertes o braço, não me puxes o cabelo, não faças boca de Drácula, pensa nas esponjas de cuspo e aguenta-te, não me obrigues a correr à volta a mesa que com os saltos não consigo, dá cá o atiçador, pronto, deixa-te de palermices, prometo que peço ao médico a marca do after-shave, aproveitas para comprar na farmácia lentes de contacto que tornam os olhos verdes, ajudo-te as pestanas com o meu rímel, só nos fica por tratar o problema do avião, se calhar lingerie preta ajuda à descolagem, se largares o atiçador faço-te voar alto, juro, se largares o atiçador
 
 
© António Lobo Antunes
Imagem: Gilberto Perin - Chapéu - Fotografia (Taormina, Sicília - Itália), 2009
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Família de espírito

Leituras para o Verão

 
José Saramago
 
 
 
 
Com os primeiros calores, já se sabe, é fatal como o destino, jornais e revistas, e uma vez por outra alguma televisão de gostos excêntricos, vêm perguntar ao autor destas linhas que livros recomendaria ele para ler no Verão. Tenho-me furtado sempre a responder, porquanto considero a leitura actividade suficientemente importante para dever ocupar-nos durante todo o ano, este em que estamos e todos os que vierem.
 
Um dia, perante a insistência de um jornalista teimoso que não me largava a porta, resolvi ladear a questão de uma vez por todas, definindo o que então chamei a minha “família de espírito”, na qual, escusado será dizer, faria figura de último dos primos. Não foi uma simples lista de nomes, cada um deles levava a sua pequena justificação para que melhor se entendesse a escolha dos parentes. Incluí nos Cadernos de Lanzarote a imagem final da “árvore genealógica” que me tinha atrevido a esboçar e repito-a aqui para ilustração dos curiosos.
 
Em primeiro lugar vinha Camões porque, como escrevi em O Ano da Morte de Ricardo Reis, todos os caminhos portugueses a ele vão dar. Seguiam-se depois o Padre António Vieira, porque a língua portuguesa nunca foi mais bela que quando a escreveu esse jesuíta, Cervantes, porque sem o autor do Quixote a Península Ibérica seria uma casa sem telhado, Montaigne, porque não precisou de Freud para saber quem era, Voltaire, porque perdeu as ilusões sobre a humanidade e sobreviveu ao desgosto, Raul Brandão, porque não é necessário ser um génio para escrever um livro genial, o Húmus, Fernando Pessoa, porque a porta por onde se chega a ele é a porta por onde se chega a Portugal (já tínhamos Camões, mas ainda nos faltava um Pessoa), Kafka, porque demonstrou que o homem é um coleóptero, Eça de Queiroz, porque ensinou a ironia aos portugueses, Jorge Luis Borges, porque inventou a literatura virtual, e, finalmente, Gogol, porque contemplou a vida humana e achou-a triste.
 
Que tal? Permitam-me agora os leitores uma sugestão. Organizem também a sua lista, definam a “família de espírito” literária a que mais se sentem ligados. Será uma boa ocupação para uma tarde na praia ou no campo. Ou em casa, se o dinheiro não deu para férias este ano. 
 
José Saramago - Publicado no blog O Caderno de Saramago
Imagem: Gilberto Perin - Livros Sagrados - Fotografia (Kairouan - Tunísia), 2009
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Transcendência

Resmungo teológico
 
Ferreira Gullar
 
Embora defira do biólogo Richard Dawkins que, nesta semana, na Flip, alardeou seu ateísmo, eu, em meio aos meus costumeiros resmungos, pus em dúvida aqui a existência da alma, chegando mesmo a lembrar que, em certa época remota, os gregos a designavam pela palavra "pneuma", que significa ar, sopro, ou seja, a respiração de quem está vivo. Nada mais que isso. Fiz essa afirmação, meses atrás, a propósito da excomunhão dos médicos que praticaram aborto numa menina, estuprada pelo padrasto. Como, para a Igreja Católica, a alma já está no momento da fecundação, praticar o aborto é matar um ser humano, dono de uma alma divina.
 
Afirmei, por isso, que, para ela, o que importa não é a vida e, sim, a alma, razão por que, durante a Inquisição, condenou à morte, na fogueira, milhares de pessoas, para salvar-lhes a alma.
 
Tem lógica mas, relendo o meu próprio artigo, perguntei-me: o que se ganha em negar a existência da alma? Pergunta essa que, feita por mim, pode surpreender o leitor.
 
É que me lembrei de que não foi a Igreja Católica quem inventou a alma. Os gregos, muito antes de Sócrates e talvez mesmo de Pitágoras, já a tinham inventado, sem falar nos egípcios, que acreditavam numa vida post mortem, mas com o corpo também e, por isso, faziam-se embalsamar. Os cultos órficos da Grécia pré-helênica fundavam-se na crença da transmigração das almas que, no além, poderiam ser premiadas ou punidas pelo que fizeram aqui em baixo. Inscrições descobertas em sepulturas daquela época contêm ensinamentos de como a alma do morto deveria se comportar para merecer a salvação.
 
Num desses textos, lê-se o seguinte: "Tu acharás, à esquerda da casa de Hades, uma fonte e, a seu lado, um cipreste branco. Dessa fonte, não te aproximarás, mas te depararás com uma outra, perto do lago da Memória. Diz: "eu sou filho da terra e do céu estrelado'". É que para eles, o corpo vinha da terra e a alma, do céu.
 
 
Essa visão do homem como ente, ao mesmo tempo, terrestre e celeste, irá ganhar consistência teórica na filosofia de Sócrates e, sobretudo, na de Platão. Pode-se supor que a admirável bravura e despreendimento daquele em face da morte, deve-se, de fato, à sua convicção de que, depois dela, havia outra vida e melhor.
 
Se Platão herda de Sócrates essa convicção, em sua teoria a existência da alma está essencialmente ligada à possibilidade do verdadeiro conhecimento. Para ele, o corpo era um fator que impedia de se conhecer a verdade, não facultada aos sentidos. Pelo contrário, na sua concepção, os sentidos nos iludem, induzindo-nos a uma visão imperfeita da realidade. Donde a conclusão de que, só depois que nos livramos do corpo, podemos apreender a verdadeira realidade da existência, a que apenas a nossa alma teria acesso.
 
Essa concepção platônica da alma influiu na visão do cristianismo e, consequentemente, na teologia da Igreja Católica.
 
Mas, até onde me é dado perceber, elas não são idênticas em todos os pontos, especialmente em um: enquanto na teoria platônica o que há de reprovável no corpo é sua incapacidade de apreender o verdadeiro conhecimento, na teologia católica, essa incapacidade se converte em pecado, isto é, o corpo, sujeito a desejos condenáveis, contamina a alma de pecados, que podem levá-la à perdição eterna. Nisto, a concepção católica parece mais próxima do orfismo que do platonismo, mais filosófico do que teológico.
 
Mas meu propósito aqui não é discutir essas questões e, sim, afirmar que, na dúvida de que a alma exista ou não, melhor será acreditar em sua existência do que negá-la, já que não há como provar uma coisa nem outra.
 
Negamos a alma porque somos herdeiros do progresso econômico e científico, que nos revelou a lógica material da natureza e da vida, e que é irretorquível. Não obstante, a própria ciência diz que não é capaz de responder a questões como esta: por que existe algo em vez de nada? Assim, o enigma da existência continua sem resposta.
 
Não fui eu mesmo quem disse que o homem inventou Deus para que este o criasse? Ele o inventou porque não quer ser igual a um simples animal, nascido da natureza, condenado a acabar para sempre. Se sou filho de Deus, tenho uma alma divina que me torna imortal. E é isso, essa capacidade de inventar-se, que nos distingue dos outros animais. Filho de Deus mesmo ou inventado por si mesmo, a verdade é que o homem necessita da transcendência e aspira à eternidade. Por isso, precisa da alma, uma vez que o corpo, após a morte, virá pó.
 
Pessoal, este papo está brabo demais! Vamos mudar de assunto?
 
Ferreira Gullar - Publicado na Folha de São Paulo / UOL

Imagem: Gilberto Perin -  Fotografia  (Cefalu, Sicília - Itália), 2009

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publicado por ardotempo às 14:36 | Comentar | Adicionar
Terça-feira, 07.07.09

Onde está a fonte?

Fotografia

 

 

 

Gilberto Perin - Fotografia - "Onde está a fonte?" - Série Conexões Infinitas  (Lisboa - Portugal), 2009 

publicado por ardotempo às 21:32 | Comentar | Ler Comentários (1) | Adicionar

Livros escolhidos por escritores

Qué leen los grandes escritores
 
Alberto Manguel
 
La lectura suele no detenerse en la última página de un libro, sino continuar más allá, contagiando a otros lectores y engendrando nuevos libros. Un libro que nos conmueve, nos irrita o nos hace reír, nos incita a hablar de él, a rodearlo de comentarios y glosas, a reescribirlo según nuestro entendimiento. Para apropiarnos de él, le otorgamos nuestro aval o nuestro rechazo, echándolo por la ventana u ofreciéndoselo a un amigo, a otro lector, para que prosiga nuestras labores. Bibliotecas enteras han nacido de este canibalismo literario, cuyos autores más célebres (Averroes, Samuel Johnson, Alfonso Reyes, Walter Benjamin) son leídos para saber qué han leído ellos, dando lugar a nuevas lecturas y nuevas bibliotecas. Quizás por eso Mallarmé supuso que sólo un buen libro debería bastarnos puesto que, a partir de él, sus lectores se encargarían de componer todos los otros.
 
Libros de lectura en el sentido más literal, las colecciones de ensayos literarios arman no ya un modelo del mundo (como hacen poetas y novelistas) sino modelos de ese modelo. Michel de Montaigne, inventor del género, advierte que el ensayo no tiene otro fin que el "doméstico y privado"; el ensayo literario insiste aún más sobre ese fin íntimo, ya que su propósito evidente es dar cuenta de una cierta lectura, singular, ocasional y tal vez arbitraria.
 
Sin embargo, a veces, el ensayo literario se presenta, no como la lectura de un determinado individuo sino como una suerte de juicio universal. Tal grandilocuencia es en pocas ocasiones convincente, quizás porque en estos casos el gusto literario se confunde con el dogma.
 
El prolífico profesor de humanidades de la Universidad de Yale, Harold Bloom, es uno de los más notables representantes de esta escuela dogmática. Los cánones le encantan, como prueban los títulos de sus últimos libros: Cómo leer y por qué, Genios: un mosaico de cien mentes creativas ejemplares, Dónde se encuentra la sabiduría y otros más. El más reciente, Cuentos y cuentistas: el canon del cuento, sigue el mismo esquema. Si bien Bloom lamenta que ciertos cuentistas autorizados (por él, claro) no han hallado lugar en su volumen (Alice Munro, Saki, Tolstói, entre otros) los que sí están aquí presentes lucen su nihil obstat y son propuestos al público ceñidos de eruditos comentarios brumosamente esclarecedores. Según Bloom, a Borges, vigésimo octavo en su canon, le faltan agallas para cometer lo que Bloom llama "la extravagancia del narrador"; Maupassant, que ocupa el undécimo lugar, "puede parecer simple pero es siempre profundamente sutil"; en Kafka, número veintiuno, "lo negativo kafkiano es sencillamente su judaísmo". No sé qué lector se beneficiará de este inventario inobjetable, clínico y banal. Ciertamente no un ávido lector de cuentos.
 
Natalia Ginzburg fue lo contrario de un promotor de cánones. En sus escritos, que apenas aspiran al rótulo de relato o ensayo, retrató los personajes de su difícil vida e intentó la crónica de sus experiencias cotidianas. Su actividad política, clandestina durante el fascismo y oficial después (fue senadora en los años ochenta) no aparece casi nunca en los textos aquí reunidos, salvo en su irónica descripción del Partido Comunista ideal, de los "años perdidos" del editor Giulio Einaudi durante el régimen de Mussolini, y de la ley contra la violencia de género que olvida las raíces de la violencia sexual. La mayor parte de estas reflexiones íntimas, refinadas, sagaces, hablan de lo que la conmueve o le aburre, o le hace detenerse y reflexionar, en películas y libros, recuerdos de muertos y de vivos, eventos contemporáneos, pequeños temas circunstanciales. Natalia Ginzburg es una de las figuras esenciales de la literatura italiana del siglo veinte: estas crónicas (la palabra Ensayos que trona en la cubierta no conviene a su delicado estilo) lo prueban cabalmente.
 
En Mecanismos internos (el tétrico título anuncia el tono del libro), J. M Coetzee, magnífico novelista que recibió en 2003 el Premio Nobel, comenta sus lecturas de unos veinte autores contemporáneos. Desgraciadamente, aquí también, como en Bloom, prima el modo didáctico. Coetzee, el imaginativo y sutil estilista de Desgracia, desparece, y en su lugar surge un profesor universitario, sin duda inteligente y letrado, pero aterrado de demostrar la más mínima emoción en sus juicios. Un ejemplo: comparando dos novelas de Italo Svevo, el profesor Coetzee nos instruye: "La atmósfera moral de esta última obra [El viejo y la jovencita] puede ser más oscura y la autocrítica más cáustica que la que podemos percibir en Zeno, un libro esencialmente cómico, pero es sólo una cuestión de grado de oscuridad o de causticidad". Tomamos nota, pero nada sabemos, como lectores, del verdadero sentimiento del lector que las describe. Ni siquiera la admirable versión castellana de Eduardo Hojman logra conceder algo de ardor a estas páginas glaciales.
 
Aldous Huxley pertenece a ese notable círculo de genios menores que regularmente rescatamos del olvido para volver a olvidarnos de ellos al cabo de una temporada en nuestras estanterías. Leo a Huxley desde mi adolescencia: lo leo y lo admiro. Sus ensayos no proponen ni la instrucción ni la conversión, sólo la pasión que lo lleva a querer compartir un descubrimiento, una iluminación, un goce intelectual o estético. Caballero eduardiano que llegó a conocer el lanzamiento de los Beatles, Huxley gozó de una curiosidad casi sin límites: intentó con éxito la novela psicológica, la utopía literaria, la crónica de viajes, el relato policiaco, la experiencia de las drogas, las ciencias ópticas, la música, las artes visuales y, por supuesto, la lectura. Esta antología, Si mi biblioteca ardiera esta noche, seleccionada con exquisito gusto e inteligencia por Matías Serra Bradford, es una espléndida introducción a su sabiduría que, como dice Bradford, puede "torcer el destino de un lector que nunca podría haberlo anticipado". Sin arrogancia ni dogmatismo, Huxley se convierte en nuestro contemporáneo, compartiendo con nosotros ciertas iluminaciones olvidadas: "La cultura no deriva de la lectura de libros", escribe en uno de estos ensayos, "sino de la lectura exhaustiva e intensa de buenos libros". Lectores, editores, libreros, responsables de las páginas literarias, todos necesitamos que alguien como Huxley nos recuerde estas verdades esenciales.
 
Alberto Manguel - Publicado em Babelia - El País
publicado por ardotempo às 01:42 | Comentar | Adicionar

Toscana

Fotografia

 

 

 

Pierre Yves Refalo - Fotografia - Toscana (Florença Itália), 2009

publicado por ardotempo às 01:35 | Comentar | Adicionar

A rua

A rua da cidade, de Itaci Batista

 

 

Ligando para Curitiba, 2009

 

 

O quiosque das celebridades, 2009

 

 

O cachorro quente, 2009

 

 

Liquidação de luxo, 2009

 

 

Ciclista de infláveis, 2009

 

Itaci Batista - Fotografia - Série A Rua (São Paulo SP Brasil), 2009 

publicado por ardotempo às 01:13 | Comentar | Adicionar

Verdes, vermelhos e amarelos

Pimentões, de Itaci Batista

 

 

 

 

 

 

 

Itaci Batista - Fotografia - Série Pimentões / Naturezas Mortas (São Paulo SP Brasil)

publicado por ardotempo às 00:45 | Comentar | Adicionar
Segunda-feira, 06.07.09

Aldyr G. Schlee na Palavraria - dia 11 de julho

Aldyr Garcia Schlee - Um oportunidade rara e preciosa para conversar com o autor

 

Na Palavraria:

 

 

11, sábado, 19h: Nós y nosotros, bate-papo com o escritor Aldyr Garcia Schlee, conversando sobre seus dois próximos livros – Don Frutos e Nos limites do impossível – Contos gardelianos e sobre a obra dos escritores Mario Benedetti e Simões Lopes Netto.
 
Aldyr Garcia Schlee (Jaguarão, 22/11/1934) é escritor, jornalista, tradutor, desenhista e professor universitário. Doutor em Ciências Humanas, publicou vários livros de contos e participou de antologias, de contos e de ensaios. Alguns livros seus foram primeiramente publicados no Uruguai pela editora Banda Oriental. Traduziu a importante obra Facundo, do escritor argentino Domingos Sarmiento, fez a edição crítica da obra do escritor pelotense João Simões Lopes Neto. Foi professor de Direito Internacional da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Pelotas – UFPel, por mais de trinta anos onde foi também pró-reitor de Extensão e Cultura.
 
É torcedor do Brasil de Pelotas, clube que chegou a ser tema do conto “Empate”, publicado em “Contos de futebol”. Criou o uniforme verde e amarelo da seleção brasileira de futebol, mais conhecido como Camisa Canarinho. Recebeu duas vezes o prêmio da Bienal Nestlé de Literatura Brasileira e foi três vezes premiado com o Prêmio Açorianos. Atualmente vive em um sítio em Capão do Leão, município vizinho de Pelotas.
 
Obras publicadas
 
2000: “Contos de Verdades”, contos (ed. Mercado Aberto)
1998: “Linha Divisória” (contos, ed. Melhoramentos)
1997: “Contos de Futebol” (contos, ed. Mercado Aberto)
1983: “Contos de Sempre” (contos, ed. Mercado Aberto)
1991: “El dia en que el papa fue a Melo” (contos, ed. de la Banda Oriental) (republicado em português como “O Dia em que o Papa foi a Melo”, ed. Mercado Aberto, 1999)
1984: “Uma Terra Só” (contos, ed. Melhoramentos)  

publicado por ardotempo às 13:48 | Comentar | Adicionar

Editor: ardotempo / AA

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