Terça-feira, 23.12.08

Mercado das Pulgas

Fotografia

 

 

Fotografia de Pierre Yves Refalo - Mercado das Pulgas  (Paris - França) 2008

publicado por ardotempo às 18:59 | Comentar | Adicionar

Acordo ignora identidades culturais

João Pereira Coutinho
 
Acordo ortográfico? Não, obrigado. Sou contra. Visceralmente contra. Filosoficamente contra. Linguisticamente contra.
 
Começo por ser contra com a força das minhas entranhas: sou incapaz de aceitar que uma dúzia de sábios se considere dono de uma língua falada por milhões.
 
Ninguém é dono da língua. Ninguém a pode transformar por capricho. Por capricho, vírgula: por mentalidade concentracionária, em busca de uma unidade que, para além de impossível, seria sinistra.
 
A língua é produto de uma história; e não foi apenas Portugal e o Brasil que tiveram a sua história, apresentando variações fonéticas, lexicais ou sintácticas; a África, Macau, Timor e Goa, que os sábios do acordo ignoram nas suas maquinações racionalistas, também têm direito a usar e a abusar da língua.
 
Quem disse que o português do Brasil é superior, ou inferior, ao português falado e escrito em Luanda, Maputo ou Dili?
 
Meu princípio filosófico: a pluralidade é um valor que deve ser estudado e respeitado. Não me incomoda que os brasileiros escrevam "ator" e "ceticismo" sem usarem o "c" ou o "p" dos lusos. Quando leio tais palavras, sei a origem delas; sinto o sabor tropical em que foram forjadas.
 
Mas exijo respeito. Exijo que respeitem o "actor" português e o "cepticismo" luso com o "c" e o "p" que o Brasil elimina.
 
Os sábios discordam. E dizem que a ortografia é simples transcrição fonética, ou de "pronúncia". Se ninguém lê "actor", com acentuação no "c", por que motivo mantê-lo? Sim, por que motivo manter esse "c" arcaico que só atrapalha a unidade da língua?
 
Lamento. Eu gosto do "c" do "actor", do "p" de "cepticismo". Eles representam um património, uma história. Uma pegada etimológica que faz parte de uma identidade cultural. Mas o "c" e o "p" não são apenas antiguidades de uma ortografia; como relembrou recentemente o poeta português Vasco Graça Moura, esses "c" e "p" abrem a vogal que os antecede e fornecem informação para pronunciar correctamente as palavras. Acordo ortográfico? O gesto é prepotente e apedeuta. Aceitar essa aberração filosófica e linguística, impensável para ingleses (ou franceses), significa apenas que a irmandade entre Portugal e o Brasil continua a ser a irmandade do atraso.
 
 
João Pereira Coutinho
 
Publicado no Blog Verdes Trigos 
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publicado por ardotempo às 15:31 | Comentar | Adicionar

Aforismo Borgesiano - 48

 Minotauro

 

"O Minotauro combina muitos traços diversos ou contraditórios. Tem algo de animal, algo de humano e até mesmo algo de divino. Comete crimes, mas sente-se inocente porque está inconsciente do que faz. Confessa sua ignorância mas orgulha-se dela. É tão magnânimo que não sabe ler."

 

 

©Jorge Luis Borges / Borges Verbal, Emecé Editores – Buenos Aires Argentina

publicado por ardotempo às 14:05 | Comentar | Adicionar

Riscos para a floresta, para os humanos e para os animais

O lado B do etanol 

 

A cada ano a safra da cana-de-açúcar bate recordes na mesma proporção em que cresce sua importância estratégica para o País. Ao mesmo tempo, o avanço da monocultura e a mecanização da lavoura ameaçam ecossistemas como o Cerrado e a Mata Atlântica, enquanto as condições de trabalho continuam duríssimas. Acompanhar os impactos sociais, ambientais e trabalhistas deste setor é um dos objetivos do Centro de Monitoramento de Agrocombustíveis, braço da ONG Repórter Brasil, que publica o relatório O Brasil dos Agrocombustíveis, Cana-de-Açúcar 2008 no dia 7 de janeiro. 

Para concluir o trabalho, ainda inédito, a equipe do CMA visitou estados como Alagoas, Pernambuco, Bahia, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, São Paulo e Acre. “Estivemos tanto em áreas onde a cultura da cana está consolidada com modos de produção modernos ou arcaicos como nas áreas das novas fronteiras”, explica Marcel Gomes, coordenador da equipe. Além das visitas de campo, onde colhiam dados e relatos de quem vive da cana, os pesquisadores ouviram especialistas e cruzaram as informações mais recentes sobre o setor. 

A apresentação começa pelo Centro-Sul, que concentra 87,8% de toda a cana produzida no País e detém 372 das 447 usinas cadastradas na Agência Nacional do Petróleo (ANP). Mais da metade delas, ou 230, estão no Estado de São Paulo. 

O relatório alerta para a ameaça ao bioma do Cerrado. “Há várias usinas circundando a região do Pantanal”, diz Gomes. “Cada região estudada apresenta um tipo de problema ambiental, sempre como conseqüência do avanço da monocultura.” 

No Nordeste, onde foi introduzida no século XVI, a cana ainda é produzida de maneira menos mecanizada que no Centro-Sul. O impacto disso aparece nas condições de trabalho e moradia dos canavieiros. Em março deste ano, uma força-tarefa do Ministério Público do Trabalho em Alagoas teve de autuar 12 das 15 usinas fiscalizadas. Uma ação do MPT em Pernambuco autuou o prefeito de Palmares, Beto da Usina. Aos jornais, o advogado José Hamilton Lins admitiu as condições precárias de trabalho, que considerou “parte de uma cultura colonial que precisa de tempo para se adequar às novas regras trabalhistas”. 

Além do problema trabalhista, o relatório dimensiona a extensão dos impactos no meio ambiente. De acordo com o Centro de Pesquisas Ambientais do Nordeste (Cepan), a cana é responsável por 95% do desmatamento da Mata Atlântica na região. Em 2008, o Ibama multou 24 usinas por crime ambiental apenas em Pernambuco. A maior parte, por desrespeitar áreas de proteção permanente (APPs) ou por não preservar a reserva legal proporcional de mata nativa. 

A terceira região abordada no relatório é a Amazônia, onde, ainda que a cana-de-açúcar não seja muito difundida, está em expansão. “O problema é que o zoneamento (ecológico-econômico) ainda não foi concluído. Mas existe uma pressão forte para que o governo barre a cana na região ao proibir que novas usinas se instalem”, prevê Gomes. Ainda há relativamente poucas usinas na região. Algumas, como a Álcool Verde, pertencente ao Grupo Farias, do deputado federal Augusto Farias (PTB-AL), foram embargadas pela Justiça. Apesar de instalada, está paralisada por apresentar diversos desacordos com a legislação ambiental.

 

 

 

Publicado em Carta Capital

publicado por ardotempo às 12:23 | Comentar | Adicionar

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